Juntando
dois posts que fiz sobre os mesmos assuntos.
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Trupe do Teatro Mágico |
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Teatro Mágico e Sociedade do Espetáculo
A trupe Teatro Mágico,
comandada por Fernando Anitelli, é uma das poucas coisas que eu consigo escutar
atualmente com certo prazer. Casualmente li uma matéria falando deles na
revista Caros Amigos. Depois assisti o clipe “Amanhã... Será?”, que se tornou
viral na rede, sem, contudo, ligar a matéria lida ao vídeo visto. Quando juntei
um com o outro, pude perceber o porquê de tamanho elogio do escritor daquela matéria.
Realmente, não só a voz, as
vestimentas, as maquiagens, os instrumentos bem executados e as belas melodias
me chamaram a atenção. O que mais me impressionou, em tempos de “Meteoro da
Paixão”, foram as letras da trupe. De conteúdo completamente crítico e
inteligente, as músicas conseguem fazer pensar, coisa muito rara na música
mundial de hoje em dia.
Particularmente, são poucas
coisas que eu ouço que têm menos de 20 anos. A maioria já tem mais de 40. Ainda
que tenha apenas 23 anos, considero que vivo no maior declínio da música e das
artes em geral.
De música atual, tenho escutado
muito o Gotan Project, que traz uma
pegada de tango com ritmo eletrônico. É bem bacana. Além disso, Reggae, muito
Chico Buarque e samba, além de Blues, meu estilo favorito. Escutar samba e
blues de qualidade com menos de 20 anos é quase impossível.
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Fernando Anitelli |
Mas, a bem da verdade, eles só ganharam mesmo minha atenção depois que vi o nome do novo disco, “A Sociedade do Espetáculo”. Ver uma banda atual fazer política e ter um sucesso desses é no mínimo interessante, ainda mais usando no título o nome de um livro de um autor marxista.
Até Che Guevara eles citam: “endurecendo
ternamente” (Amanhã… Será) – “Hay que endurecerte, pero sin perder la ternura jamás”
(Che Guevara).
A
Sociedade do Espetáculo é uma obra escrita, de autoria de Guy
Debord (1931-1994). Debord era um bom intérprete de Karl Marx, e conseguiu
traduzir muito bem as ideias do livro “O
Capital”.
Conheci Debord de minhas
andanças pelas literaturas de esquerda. Confesso que não li todo “A Sociedade
do Espetáculo”, mas dei umas boas passadas pelas suas páginas.
A trupe ainda se inspira num
dos melhores romancistas que eu já li, Hermann
Hesse, escritor alemão, que retrata no livro “O Lobo da Estepe” as diversas
personagens que temos de adotar no nosso quotidiano.
Com grande maestria, Teatro
Mágico faz o mesmo, traduzindo a pós-modernidade à poesia da nova geração, os
descendentes do capitalismo, das Ditaduras e das diferenças sociais.
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Breve histórico das manifestações culturais
As manifestações culturais
costumam dizer muito sobre o que se passa em sua contemporaneidade, sobretudo a
música. O Blues falava de escravidão, da tristeza do negro escravizado e,
paralelamente, no Brasil, o samba faz também essas e outras críticas; o rock
sobre as mazelas dos sistemas, sempre sendo transgressor da ordem; o rock and
roll clássico/psicodélico sobre a experimentação das drogas sintéticas e contra
as guerras, pelo discurso do “Paz e Amor”; o Reggae sobre o ufanismo da
religião Rastafári e sua bela ideologia, assim como a música gospel dos EUA da
época; e o movimento Punk, que era o mais revolucionário, mais anarquista e
menos favorável qualquer coisa que fosse estatal.
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Da Atualidade
Nesse contexto, com o nosso Zeitgeist (espírito do tempo), a banda Teatro Mágico captura, em sua música “Amanhã…
será?”, o espírito das manifestações revolucionárias que aconteceram no mundo
recentemente. Já com um discurso bem crítico sobre o status quo, a banda - também com sua manifestação corporal, vez que
se trajam como palhaços, com as expressões pintadas na face -, incorpora essa
alma contestadora que remonta às antigas manifestações culturais
revolucionárias de todas as épocas. (Revolucionárias no sentido de ser o contraponto
ao conservadorismo, no sentido de mudar o que está no presente, buscando uma
melhora social, como acontece nas manifestações contra os regimes totalitários do
nosso século).
Creio que, se continuar
nesse nível, a trupe poderá se tornar a grande revelação da década, pois
conseguiram transcrever o que está acontecendo no mundo com uma linguagem e
musicalidade bem jovem e atual, com letras bem construídas e maduras. Até
porque eles proliferam sua arte pela internet, reduto dos novos pensadores.
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As Manifestações Cibernéticas
Dessa forma, a banda nos remete a outra manifestação bem atual. Diversas manifestações aconteceram no mundo nesse ano. Elas iniciaram de uma forma bem peculiar: pelas redes sociais. As redes sociais, antes usadas apenas para fazer amigos, fazer publicidade e mostrar as maiores babaquices da mente humana, ganharam outra finalidade: propagar uma ideia inteligente a muitas pessoas.
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Revoluções do Egito |
As redes sociais deixaram de
ser inocentes. Passaram a proceder diversas revoluções pelo mundo. Não sei onde
especificamente tudo se iniciou, mas muitas coisas mudaram depois que jovens,
que antes não tinham acesso às redes, passaram a utilizar a internet para mudar seu país. Isso se
deu muito pela troca de informações e de reivindicações, comuns a todos os
jovens que, entretanto, não podiam partilhar suas ideias nos meios tradicionais.
“O
post é a voz que vos libertará/Descendentes
tantos insurgirão/A arma, o réu, o véu cairá” (Amanhã... Será?).
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Revoluções na Líbia |
Há alguns anos uma blogueira
já ganhava fama por conseguir burlar o sistema cubano de controle da internet e falar mal do gobierno de Cuba.
Agora, jovens derrubam
governos totalitários no oriente, protestam a favor de minorias na Inglaterra e
marcam encontros para protestar contra políticas neoliberais na Grécia.
“O
sol reclama no Oriente/Brada a lua que ilumina/Rebelando orações e mentes” (Amanhã...
Será?).
Ninguém pensava que a internet
pudesse atingir objetivos dessa natureza. Mas os jovens, sempre descontentes
com os problemas sociais e com o status
quo, mostraram que podem muito mais que divulgar coisas comezinhas e
idiotas; mostraram que a internet pode ser muito mais do que a publicidade
comercial busca.
Facebook, Orkut, Twitter e
outras redes têm o poder de organizar manifestos, ideias em prol de uma
sociedade mais equânime e justa.
Captando isso, a banda
Teatro Mágico entra para os livros de história como a poesia que sintetizou bem
essa evolução, mesmo com um discurso já antigo.
Um bom exemplo de luta antiga que eles abordam é a música Canção da Terra, que versa sobre as questões de reformas agrárias e os sem-terras, marginalizados pela grande mídia e pelos defensores da propriedade privada. Belíssimas frases foram criadas, tais como: “No princípio o verbo se fez fogo. Nem Atlas tinha o globo. Mas tinha nome o lugar. Era terra, terra. E fez o criador a natureza; fez os campos e flores, fez o mar; fez, por fim, então, a rebeldia, que nos dá a garantia, que nos leva a lutar, pela terra, terra”.
Também preciosidades como: “Ser e ter o sonho por inteiro; ser
sem-terra, ser guerreiro, com a missão de semear à terra. Mas, apesar de tudo
isso, o latifúndio é feito inço, que precisa acabar, romper as cercas da
ignorância, que produz intolerância. Terra é de quem plantar à terra, terra”.
Pretendo ver a trupe ao vivo, pois gostei nos vídeos do espetáculo que se faz no palco.
Pretendo ver a trupe ao vivo, pois gostei nos vídeos do espetáculo que se faz no palco.
E espero continuar ouvindo a
voz rouca de Anitelli cantando as belas coisas que compõe, assim como espero
continuar vendo a juventude fazendo revoluções e se rebelando contra as coisas
erradas.
Se as revoluções sociais feitas
pelas mídias sociais e a música brasileira ainda têm jeito, creio que everything is gonna be alright.
Só faltamos nós, aqui do
ocidente, sairmos de nossa zona de conforto, com nossos iPods, iPads e iPhones, fazendo a “comunidade viva insurrecer o valor da paz, endurecendo
ternamente”. Amanhecerá e, amanhã, será!
Bravo, bravo! Belas verdades!
ResponderExcluirBelas palavras. TM é tudo de bom!
ResponderExcluirPerfeito! vou colocar o link do seu blog no meu, pode?
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